São Paulo 9/12/2021 – Infelizmente, o Brasil é sabidamente um país com alto índice de automedicação. Com a bula junto à embalagem, é possível uma melhor compreensão do medicamento.

Medida polêmica é um risco para a saúde das pessoas, principalmente da população mais carente, afirmam especialistas.

Segundo a Agência Câmara de Notícias, a Câmara dos Deputados aprovou, em 25 de novembro, o regime de urgência para a aprovação do Projeto de Lei 3846/21, do deputado federal André Fufuca (PP-MA), que institui a bula digital de medicamentos, disponível por meio da tecnologia de QR Code.

O PL quer extinção da bula impressa do medicamento o que, segundo especialistas, tem consequências graves para a saúde da população. Segundo o IBGE, mais de 40 milhões de pessoas não têm acesso à internet. Isso significa que mais de 25% da população ficará sem às informações sobre os medicamentos. 

“A falta da bula também gera uma fragilidade jurídica para os laboratórios farmacêuticos a partir do momento em que podem ser processados por problemas com suas medicações, já que as pessoas teriam dificuldades para acessar as informações básicas do remédio”, afirma o advogado Dr. Alexandre Rohlf Morais.

Ele complementa dizendo que a bula digital já coexiste com a bula impressa e, desta forma, é necessário que o direito à informação seja protegido, haja vista que o acesso digital é restrito, não abrangendo grande parte da população. “A inclusão digital não pode, de forma alguma, representar a exclusão da disponibilidade da informação para os grupos sem acesso digital”, afirma Morais.

“O custo da bula impressa é ínfimo. Não representa praticamente nada no preço do medicamento. Porém, tem um valor imensurável na questão da saúde e segurança de todos que necessitam dela. Ter de acessar uma informação sobre um remédio tendo como pré-requisito um telefone carregado e com plano de dados é inconcebível, um contrassenso à praticidade e um risco enorme à população”, argumenta.

Ele ainda diz que restrições e fragilidades ao acesso digital são imensas, além de grande parte da população não possuir smartphone ou internet disponível a qualquer momento. “Tem os idosos e pessoas que não estão completamente familiarizadas com o mundo digital e ainda há grande possibilidade de ataques cibernéticos e sites fora do ar, o que impossibilitaria 100% das pessoas à informação, a um tempo que não podemos prever. Isso pode ser fatal!”

Sidney Anversa Victor, presidente da ABIGRAF Nacional – Associação Brasileira da Indústria Gráfica, explica que inúmeros problemas adicionais devem ser considerados.

Segundo o presidente, o PL está levando em consideração que toda a população brasileira tem acesso à internet e de qualidade, o que não é verdade. “Além dos números apontados pelo IBGE e outras informações citadas acima, vemos que a qualidade da internet é sofrível em grande parte do território nacional. A visibilidade deste fato foi acentuada pela pandemia, quando alunos tiveram de acessar as aulas on line e os de baixa renda registraram inúmeros problemas para tal. Portanto, pergunto: como querem implantar algo assim de forma emergencial sem um amplo debate a respeito? Não pode! Temos de debater à exaustão já que estamos lidando com saúde, com qualidade de vida e risco de morte”, alerta Sidney Anversa.

Um argumento que foi levantado em defesa da bula digital exclusiva, sem a impressa, é de que ela pode ser atualizada rapidamente e on-line. Anversa explica que este argumento não pode ser levado a sério já que, para se alterar uma bula, existe a necessidade de realização estudos científicos, com novos dados analisados e testados profundamente, o que, diferentemente de um cardápio de restaurante, não pode ser alterado rapidamente e a todo momento.

“Outro ponto importantíssimo é que o papel da bula não é somente reciclável, mas biodegradável. Ele é também matéria prima para uma infinidade de produtos e itens de consumo primário, tais como: livros, revistas, jornais, embalagens, rótulos, material promocional, cadernos, papel higiênico, guardanapo, caixas de embarque, entre muitos outros. Além disso, no Brasil 100% da produção de celulose e papel vêm de florestas plantadas de eucalipto e pinus. Ou seja, estas plantações de florestas trazem inúmeros e importantes benefícios ambientais e socioeconômicos. Dentre eles, a absorção de bilhões de toneladas de gás carbônico (CO2) da atmosfera, eficiente medida contra o aquecimento global, além da geração de emprego e renda nas respectivas regiões. Ou seja, não há, em absoluto, argumento para se extinguir a bula impressa”, detalha.

O presidente da Abigraf também chama atenção para um outro problema muito grave. “Infelizmente, o Brasil é sabidamente um país com alto índice de automedicação. Com a bula junto à embalagem, é possível uma melhor compreensão dos efeitos do remédio, diminuindo drasticamente os riscos de sua ingestão”, diz.

A advogada Dra. Ana Luiza Castro, presidente da Subsecção de Barueri da OAB/SP, vê com preocupação o Projeto de Lei em questão: “Trata-se de violação ao consagrado direito à informação previsto no Código de Defesa do Consumidor. O consumidor não pode depender de tecnologias ainda não disponíveis a todos para poder acessar o conteúdo e a posologia de um medicamento”.  Ela complementa demonstrando espanto diante de um PL tão importante que tramita de forma urgente sem o necessário debate da sociedade.

“Entendemos que o processo de transformação digital é algo importante para todos! Porém, em nosso país isso ainda não está à disposição de toda a população e afeta principalmente os mais vulneráveis. E em se tratando de saúde ao paciente, é insustentável pensar em abrir mão desta tão importante, imprescindível e vital ferramenta de informação. Estamos à disposição para debater com os parlamentares, inclusive com o deputado federal André Fufuca, para mostrar os graves riscos da medida. É mais que urgente, isto sim, um amplo debate com a sociedade a respeito e não a aprovação do projeto do jeito que está”, finaliza Sidney Anversa Victor, presidente da ABIGRAF Nacional.

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